sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

A crise no setor elétrico é institucional

A crise no setor elétrico é institucional O grande desafio de um modelo de setor elétrico eficiente é equilibrar modicidade tarifária e garantia de suprimento. Ou seja, a tarefa árdua consiste em encontrar uma tarifa de equilíbrio que ao mesmo tempo em que proteja consumidores e ajude a controlar inflação também seja atraente a ponto de as empresas fazerem investimentos de longo prazo. Neste início de 2015, o Brasil enfrenta um cenário hidrológico bastante desfavorável. Como aproximadamente 80% da geração de eletricidade no Brasil é de origem hidráulica, faz-se necessário usar térmicas, a gás e carvão, principalmente, mais caras para os consumidores. Mas, tal qual a crise de 2001, neste ano não se pode culpar São Pedro. O ano de 2001 também começou com seca recorde no país, com exceção da Região Sul, onde se vertia água, devido à restrições de transmissão. Porém, as raízes daquela crise, que culminou no racionamento de energia em 2001-2002, não estão nos céus, mas na falta de investimentos em expansão que datavam dos anos 1980. Tal falta de investimento se agravo devido à incorreta formulação do modelo do Mercado Atacadista de Energia - MAE, que não funcionou e que, por ter regras pouco claras, não atraiu investimentos em expansão do sistema. A falta de chuvas no ano de 2001 foi apenas um elemento adicional. O modelo institucional implantado em 2004, Lei 10.848/2004, procurou enfrentar o problema da coordenação do setor elétrico levando a um caminho de planejamento estatal, dadas as organizações criadas (EPE, CMSE, e.g.). Ou seja, no jargão da Economia dos Custos de Transação, mais hierarquia que mercado. Tal modelo foi bem sucedido durante a década de 2000. Agora, a situacão é semelhante ao ano de 2001. A escassez de chuvas é apenas um detalhe que revela as incongruências institucionais após o anúncio da MP 579/2012, convertida na LEi n. 12.783/2013. Tal legislação dispõe sobre o regime de concessões e a redução do preço de energia elétrica. Após sua edição, os investimentos em expansão do parque gerador foram reduzidos, dado que desencorajou substancialmente os investidores, privados e públicos (estaduais e municipais). A referida Lei, de forma unilateral e não dialogada, antecipou prazos de vencimentos de concessões, reduziu tarifas que impediram a expansão do sistema. Em suma, deixou indefinido o ambiente institucional do setor elétrico brasileiro. A medida foi extremamente danosa para as empresas do setor, a ponto de somente a Eletrobras, que é estatal, ter aceito os termos da Medida Provisória. Porém,pagou preço elevado por isso, dado que seu valor de mercado despencou, em especial a partir de setembro de 2012, as ações da empresa caíram significativamente. Assim, a estratégia do governo de interferir de forma unilateral na coordenação do setor mostrou-se equivocada e repercutiu seriamente nas finanças das empresas, especialmente das distribuidoras, obrigado o próprio governo a criar um fundo por meio da CCEE para tentar resolver o problema, que, no fim das contas, será financiado pelo bolso do consumidor. Assim, em um setor onde atuam agentes dos mais diversos tamanhos e com propriedades difusas e distintas a tentativa de coordenação central por meio do governo revelou a fragilidades das instituições no Brasil. Assim, a escassez de chuvas é apenas um item revelador de tais erros e da fragilidade das instituições do país. Donde se pode concluir que a crise é de natureza institucional.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

O blog energiaemercados.blogspot.com está de volta à ativa. Visando sempre ao debate democrático sobre o setor elétrico brasileiro.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Belo Monte vs Eólicas

Trocar Belo Monte por parques eólicos custaria até R$83 bilhões, diz estudo

Análise do Gesel-UFRJ defende usina e ainda aponta que uso de energia solar exigiria R$500 bilhões

Por Luciano Costa




Um levantamento feito pelo Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Gesel-UFRJ) aponta que erguer parques eólicos com potência equivalente à hidrelétrica de Belo Monte (11.233MW), que está sendo construída no rio Xingu, Pará, custaria entre R$47,8 bilhões e R$83,6 bilhões. Ainda de acordo com o estudo, a alternativa de uso de energia solar exigiria investimentos de algo entre R$355 bilhões e R$507 bilhões. A megausina do Xingu está orçada em R$25 bilhões.

Para os especialistas do Gesel, utilizar essas fontes renováveis ao invés de construir a megausina implicaria em “perda de competitividade da economia brasileira, em função do diferencial de custos dessas fontes em relação à hidroeletricidade” e em “problemas de garantia e segurança do suprimento em função da sazonalidade e intermitência” dessas formas de geração.

O estudo aponta “menor densidade energética” e “imaturidade tecnológica” dessas fontes. Assim, para substituir Belo Monte à altura, “seria obrigatória” a construção de termelétricas. Nesse sentido, o grupo compara os custos de mitigação de impactos sócio ambientais. Em Belo Monte, serão R$3,3 bilhões destinados a esse fim. No caso de térmicas a gás natural – as menos poluentes – a estimativa é de que o impacto ambiental custaria R$24,1 bilhões, quase oito vezes mais.

“Foi possível constatar que políticas de eficiência energética e investimentos em fontes alternativas de energia são incapazes de atender por si só o crescimento da demanda por energia elétrica”, conclui o Gesel. O estudo é assinado pelo coordenador do grupo, Nivalde José de Castro, e os pesquisadores André Luís da Silva Leite e Guilherme Dantas.

Para chegar às conclusões apresentadas, o Gesel mostra os números utilizados como referência. Para os parques eólicos, foi calculada uma tarifa média de R$148 por MWh e um fator de capacidade médio de 30%. Nos últimos leilões, porém, a fonte chegou a uma tarifa de R$100 por MWh e as usinas prometeram índices de eficiência acima dos 50%. Na geração solar, os especialistas utilizaram como referencial um custo de R$500 por MWh. A tarifa de Belo Monte para o consumidor regulado será de R$78 por MWh.

Clique aqui (http://www.nuca.ie.ufrj.br/gesel/TDSE35.pdf) para acessar a íntegra da análise.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Mais sobre a polêmica de Belo Monte

O coordenador do Gesel, Prof. Nivalde de Castro, participou da TV Belo Monte esclarecendo questões relacionadas à construção da Usina. A proposta dos vídeos é debater a importância e o impacto das obras, promover uma monitoração audiovisual do empreendimento e ser uma oportunidade para a sociedade acompanhar e discutir o projeto com informações básicas.

Para assistir à TV Belo Monte, clique aqui.

Confira também o Texto de Discussão Análise comparativa entre Belo Monte e empreendimentos alternativos: impactos ambientais e competitividade econômica. O estudo, elaborado por pesquisadores do Gesel, analisa as condicionantes ambientais e econômicas da UHE de Belo Monte em comparação a todas as outras possibilidades de geração de energia elétrica.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Texto Sobre Belo Monte

No texto abaixo, um debate mais elegante sobre a construção de UHE Belo Monte.

Belo Monte: Notícia ou Novela?
Adjútor Alvim*

Alguns artistas da Rede Globo gravaram um vídeo sugerindo aos internautas assinarem uma petição eletrônica contra a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

Neste vídeo, produzido pelo "Movimento Gota d´Água", os atores listaram uma série de problemas relativos ao empreendimento e seus impactos.
A ecofumante


Vamos tentar ignorar a questão cênica, deixar sutiãs à parte e focar nas questões concretas, buscando avaliar se procedem ou não.

Operação de somente 1/3 da capacidade

Diz o vídeo:

"Do que adianta construir a terceira maior hidrelétrica do mundo, se ela só vai produzir, de fato, um terço da sua capacidade"

"Porque durante 8 meses do ano, aquela região praticamente seca"

O texto está correto ao dizer que a usina não produzirá 100% de sua capacidade instalada durante todo o tempo.

O que o texto não diz é que isto é uma característica das hidrelétricas modernas ao eliminar os reservatórios de acumulação com o objetivo de diminuir os impactos ambientais.

Em artigo para a Folha de São Paulo em 12-fev-2011, Luiz Pinguelli Rosa, físico e ex-presidente da Eletrobrás em 2003-2004, aponta que Belo Monte terá potência máxima instalada de 11GW e produção média de 4,6 GW, determinando um fator de capacidade de 42%. Este valor é menor que os de Jirau e de Santo Antônio e da média das hidrelétricas brasileiras, que é pouco acima de 50%.

Outras médias são 21% nas hidrelétricas na Espanha, de 32% na Suíça, de 35% na França e no Japão, de 36% na China e de 46% nos EUA.

Fator de capacidade das hidrelétricas brasilerias. Fonte: Wikipedia


24 Bilhões de reais de recursos públicos

"...e vai custar 30 Bilhões!"

"80% desse dinheiro é de imposto"

"São 24 bilhões que vão sair do seu bolso"

Neste ponto, o vídeo mais confunde que esclarece. O custo estimado pela mercado realmente é de 30 Bilhões. Os 80% mencionados referem-se ao valor financiado pelo BNDES.

Conforme o site do banco:
"85% dos itens financiáveis, limitada a 80% do investimento total. O capital próprio dos acionistas deverá ser de, no mínimo, 20% do investimento total do projeto..."

Portanto, os 24 bilhões seriam referentes ao crédito oferecido pelo BNDES e que retornarão a seu caixa, acrescidos dos juros referentes ao financiamento.
Isto não quer dizer que não haja dinheiro público. O consórcio responsável pelo empreendimento é composto por:
Composição do consórcio Norte Energia S.A.

O Grupo Eletrobrás tem 70% de capital estatal. Temos, portanto, em Belo Monte:
Investimento direto estatal de 10,5 Bilhões (70% de 50% de 30 Bilhões);
Financiamento do BNDES de 24 Bilhões (80% de 30 Bilhões).
Discutamos Belo Monte, discutamos participação do tesouro em empresas de energia, discutamos financiamento público para obras de infra-estrutura.

Misturar estas coisas, entretanto, é poluir o debate.

Efeitos sobre o parque nacional do Xingu

Em termos de danos ambientais o video diz que

"Só que abaixo da barragem, o rio banha o Parque Nacional do Xingu"

Veja no primeiro mapa onde se localiza o Parque Nacional do Xingu e, no segundo, onde fica Altamira, município mais próximo da Usina de Belo Monte.
Parque Nacional do Xingu
(http://pib.socioambiental.org/pt/povo/xingu/1539)








Altamira









Continuam os artistas:

"A Usina de Belo Monte vai alagar, inudar, destruir 640 km2 de floresta amazônica"

Em relação a outras usinas de grande capacidade, a área alagada de Belo Monte não é grande, conforme tabela abaixo:
Capacidade instalada X área alagada. Fonte: Wikipedia

Ressalte-se que a manutenção de uma área alagada reduzida é a principal razão do relativamente baixo aproveitamento da capacidade instalada no período de estiagem. Com um pequeno reservatório, a usina tem que contar com o fluxo normal do rio para gerar energia. Esta superfície foi, portanto, um valor para equilibrar a viabilidade financeira do empreendimento com o menor impacto ambiental possível.

Vamos tentar entender o que significam 640 km2.

O gráfico abaixo mostra o desmatamento anual da Amazônica até 2008:



640 km2 são cerca de 5% do desmatamento anual da Amazônica.

Correspondem a 64.000 hectares

Há propriedades de 64.000 hectares que podem ser compradas na Amazônia.


Fontes alternativas: eólica ou solar

Outro ponto levantado no video diz respeito às fontes alternativas de energia. O texto diz:

"É possível criar outras alternativas para se gerar energia. Energia eólica! energia solar!"

Sim, é fato.


Turbinas Eólicas

Um problema que prejudicava os investimentos em energia eólica era o custo do MW/h gerado. Isto está mudando.

Com a crise no mundo desenvolvido, os fabricantes de equipamentos para este tipo de usina estão reduzindo as margens a fim de conquistar mercado no Brasil, o que barateia o custo do MW/h.O governo contratou o MW/h de energia eólica por R$ 140,00 em 2009; por R$ 130,00 em 2010 e R$ 99,00 em agosto de 2011.

Para as grandes hidrelétricas, os preços negociados para fornecimento por MW/h foram R$ 71,40 de Jirau, R$ 78,90 de Santo Antônio e R$ 77, 97 de Belo Monte.

A energia éolica continua mais cara que a das grandes hidrelétricas, mas já é mais barata que a das PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas) e da biomassa.

Sua participação na matriz energética brasileira, hoje em 0,8%, deverá atingir 7% em 2020, conforme prevê o PDEE (Plano Decenal de Expansão de Energia), da EPE (Empresa de Pesquisa Energética):

"A capacidade instalada no Sistema Interligado Nacional deverá evoluir dos cerca de 110.000 MW em dezembro de 2010 para 171.000 MW em dezembro de 2020, com a priorização das fontes renováveis (hidráulica, eólica e biomassa). Se por um lado a participação das hidrelétricas cairá de 76% para 67%, a geração oriunda de fontes alternativas, como a de usinas eólicas, de térmicas à biomassa e de PCHs, vai dobrar em dez anos, de 8% para 16%. A geração eólica será destaque, aumentando de 1% para 7%. Com isso, a fatia de fontes renováveis se manterá em torno de 83% ao final do decênio."

Ou seja, apesar de ainda ser mais cara, já existem investimentos para desenvolver energia eólica no Brasil e, dentro das fontes renováveis, o planejamento é de diminuição da participação das hidrelétricas de grande porte.

Algumas informações interessantes sobre energia eólica no Brasil estão em:
Energia Eólica é Destaque em Leilões
Futuro da Energia Eólica no Brasil
Sobe Participação da Energia Eólica na Matriz Energética Brasileira
Participação da Energia Eólica pode Chegar a 15% em 2020


Estrelas globais podem ter em casa

Sobre energia solar é consenso que ainda não há tecnologia suficientemente eficiente para gerar energia em larga escala.

Talvez os artistas nos dêem o exemplo e instalem painéis solares em suas residências.







Dezenas de hidrelétricas na Amazônia

Na sequência, o vídeo informa:

"Esta é a primeira de dezenas de hidrelétricas que o governo pretende construir na Amazônia nos próximos anos."

Veja, no mapa de 2008 abaixo, que as bacia do Amazonas, a do Tocantins-Araguaia e a do Paraná possuem alto potencial hidráulico, sendo que o aproveitamento era, à epoca, de 1%, 44% e 72% respectivamente.

Hidreletricidade: potencial e capacidade instalada

Faz todo sentido, portanto, que se construam hidrelétricas na Amazônia.

No geral, o Brasil tem capacidade instalada para somente um terço de seu potencial hidrelétrico.

Isso não quer dizer que a sociedade não deva estar atenta a cada projeto para avaliar seus inevitáveis impactos ambientais e participar, em tempo hábil, das decisões de realização ou não dos empreendimentos, de quais impactos serão aceitos e quais deverão ser evitados.
Fonte PNE 2030

Observe que 38% do potencial hidráulico da bacia do Amazonas pode ser realizado sem impacto ambiental.

Populações afetadas

O vídeo agora se preocupa com os habitantes da região:

"Pra onde vão ser levados os ribeirinhos e os índios?"

A figura abaixo mostra o projeto de Belo Monte, conforme dados fornecidos pelo Relatório de Impacto Ambiental aprovado pelo Ibama para emissão da Licença Ambiental:


O alagamento para formação do reservatório não inundará áreas indígenas.

Para estes, o grande impacto do projeto será a diminuição da vazão Rio Xingu entre a barragem principal e a casa de força principal. Nesta região, existem duas comunidades indígenas.

A Reserva Indígena Paquiçamba
População: 95 habitantes
Representação:Associação da Comunidade Juruna do Xingu do Paquiçamba (ACOJUPA)
http://pib.socioambiental.org/caracterizacao.php?id_arp=3788
A Reserva Indígena Arara da Volta do Grande Xingu
População: 111 habitantes
Representação: não existe
http://pib.socioambiental.org/caracterizacao.php?id_arp=4302

Mais ao Sul, uma outra terra indígena na bacia de um dos afluentes do Xingu, o Bacajá, pode ser afetada pela alteração do regime hidríco da região.

A Reserva Indígena Trincheira Bacajá
População: 746 habitantes
Representação: Associação dos Índios Kaiapó da Aldeia Potikrô (AIKAP)
http://pib.socioambiental.org/caracterizacao.php?id_arp=3609
A diminuição da vazão do Xingu e, eventualmente, do Bacajá pode interferir nestas comunidades ao dificultar a navegação e prejudicar caça e pesca.

Por isso, consta no Relatório de Impacto Ambiental de Belo Monte que:

"Para garantir a navegação no Trecho de Vazão Reduzida durante o período de seca, os estudos feitos no EIA mostraram que não podem ser liberadas pelo AHE Belo Monte, neste trecho, vazões menores que 700 metros cúbicos por segundo. Caso contrário, a navegação será interrompida em várias partes do Trecho de Vazão Reduzida."
"Assim, foram definidos no EIA esses dois valores mínimos de vazão para se diminuir a perda de ambientes para os peixes que dependem dos pedrais (4.000 metros cúbicos por segundo) e para aqueles, além de outros animais, que dependem das planícies aluviais (8.000 metros cúbicos por segundo)."

Se estas ações serão suficientes para evitar impactos significativos na vida destas comunidades ainda é impossível dizer. Mas ainda existem recursos financeiros que podem ser destinados a atuar sobre os danos ambientais à media que o empreendimento for se desenvolvendo.

A expectativa do governo e consórcio responsável pelo empreendimento é que os índios permaneçam onde estão com adaptações insignificantes em suas rotinas.

A segunda metade da pergunta do vídeo diz respeitos os ribeirinhos. A população diretamente afetada é apontada na tabela abaixo:
Fonte: Relatório Impacto Ambiental


Só para termos idéia do que são estes números, vamos a exemplos de obras publicas que demandam desapropriação, frisando que os números acima não implicam, necessariamente, em deslocamento.

Para construir a Transcarioca, obra de mobilidade para Copa 2014, o município do Rio de Janeiro vai desapropriar, total ou parcialmente, 3.630 imóveis.

A obra do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), também visando a Copa 2014, demandará a retirada de 3.200 famílias em Fortaleza.

Em São Paulo, a interligação da avenida Roberto Marinho (antiga Água Espraiada) com a rodovia dos Imigrantes propõe a desapropriação de 11.400 famílias.

Desapropriações são necessárias em uma infinidade de obras públicas, então não faz sentido um posicionamento contrário a um empreendimento em função da necessidade de deslocamento de famílias.

Evidente que estes deslocamentos devem ser minimizados e, os casos inevitáveis, corretamente indenizados.

Belo Monte, em particular, oferece as seguintes opções aos afetados pela construção e operação da Hidrelétrica:

Fonte: Relatório de Impacto Ambiental


Os índios foram ouvidos?

Nesse ponto, surja talvez a pergunta mais relevante do vídeo:

"Será que os índios são ouvidos?"


Segundo Dilma Roussef, em Conversa com a Presidenta de 9-agosto-2011:

Conversa com a Presidenta

"... e o reservatório não vai atingir nenhuma das dez terras indígenas da área. Os povos indígenas não serão removidos de suas aldeias. Belo Monte talvez seja o empreendimento que mais se cercou de cuidados em relação às comunidades indígenas e ao meio ambiente. Desde o início, realizamos 38 reuniões de esclarecimentos e de consultas nas aldeias da área, além de quatro audiências públicas na região, que atraíram mais de 8 mil participantes. O resultado foi a reformulação do projeto original. Por exemplo, a área de inundação foi reduzida em aproximadamente 60%."

Segundo a FUNAI em nota de 05-abril-2011:

"Em todas as terras indígenas a Funai cumpriu seu papel institucional no processo de esclarecimento e consulta junto às comunidades indígenas, realizando mais de 30 reuniões nas aldeias, documentadas em áudio e vídeo."

"...em setembro de 2009, foram realizadas audiências publicas nas cidades paraenses de Brasil Novo, Vitória do Xingu, Altamira e Belém, atraindo cerca de 8.000 participantes, dos quais mais de 5.000 em Altamira, dentre eles, aproximadamente, 200 eram representantes indígenas."

"Ressalte-se, também, que no mês de fevereiro de 2011, realizou-se seminário em Brasília para o qual foram trazidas lideranças indígenas da região de Belo Monte para informação dos povos sobre as etapas do projeto."

Buscando o contraponto às posições oficiais, não foi possível encontrar muito material.

Da Terra Indígena Paquiçaba, descobre-se que a aldeia dividiu-se sobre a usina em abril de 2010. No dia 17 daquele mês, o Estado de Sâo Paulo informou:

"Metade da aldeia, inclusive o cacique Manuel, de 70 anos, vê com bons olhos a construção da usina, de 11.233 megawatts (MW). A outra ala, um pouco mais jovem, não pode nem ouvir falar do empreendimento, que custará R$ 19 bilhões."

Sobre a Terra Indígena Arara da Volta do Xingu, na mesma reportagem, o Estadão toma o depoimento do ancião mais velho da aldeia:

"Por isso digo que essa usina vai acabar com nossas vidas aqui. Belo Monte virou minha grande tristeza."

O ativismo do cacique, sobrinho do ancião, contra a usina também é mencionado mas não se consegue dar um panorama geral da visão dos índios.

Já a terceira comunidade indígena mais afetada, a Terra Indígena Trincheira Bacajá, pediu providências ao Ministério Público do Pará em outubro de 2011, conforme divulgou a Assessoria de Imprensa do órgão em nota de 08 de novembro de 2011. Ainda segundo a nota:

"Os índios, durante a visita do procurador, relataram que os engenheiros da Norte Energia afirmaram por diversas vezes que eles seriam informados dos impactos, o que ainda não aconteceu."; e

"Com a diminuição de 80% a 90% no volume de água da Volta Grande, os indígenas concluem que haverá o desaparecimento dos peixes."

Por sua vez, o seminário realizado em Brasília em 7 de fevereiro de 2011 ( “A Hidrelétrica de Belo Monte e a Questão Indigena”) não teve repercussão na grande imprensa. A nota divulgada ao final do evento foi bastante crítica em relação à obra e seus impactos ambientais. Também recebeu críticas severas a condução do empreendimento por parte dos agentes públicos e privados, apontando subestimação de impactos ambientais, sociais e antropológicos e pequeno nível de diálogo com as comunidades indígenas. Veja a íntegra da nota aqui.


Precisamos ficar mais atentos ao Brasil

Por fim, um alerta dos participantes do vídeo que, embora seja inteiramente correto, deveria soar a eles mais como uma auto-crítica do que uma efetiva recomendação.

"Ninguém vai discutir o assunto? A gente vai fingir que nada tá acontecendo?"

"Precisamos ficar mais atentos ao Brasil"

Também deveria soar como autocrítica aos que voltam todo sua atenção política para o acompanhamento da última novela das 8 de queda ministerial e esquecem que dinheiro público não é só gasto com corrupção, mas também com investimentos cuja desenrolar nos impacta diretamente.

O projeto de Belo Monte é discutido há mais de 30 anos e houve inúmeras oportunidades de debate desperdiçadas pela sociedade.



Fonte: Norte Energia S.A.

A imprensa brasileira escrita e televisiva foi extremamente ausente no divulgar, discutir e repercutir o empreendimento Belo Monte. Houve inúmeros eventos e marcos praticamente ignorados pela mídia onde o governo ficou à vontade para impor seu peso sobre os agentes socias enfraquecidos pela ausência da caixa de ressonância que um jornalismo atuante lhe proporcionaria.

Como ilustração, basta uma visita a um painel que lista os eventos relativos à Amazônia em 2010. Repare a pequena participação de Belo Monte na agenda amazônica do ano em questão.

Outro exemplo é a repercussão que o seminário de fevereiro/2011 sobre a questão indígena de Belo Monte teve na Folha de São Paulo. Abaixo, você vê todo o espaço dedicado pelo jornal ao seminário.


TRIBO Fernando Bizerra Jr./Efe



Ontem, em Brasília, índios fizeram atos contra a construção de Belo Monte

Enfim, enquanto a sociedade brasileira não se conscientizar e se interessar pelo processo político, acompanhando e participando das discussões no seu devido tempo, ficará adormecida, aguardando que um vídeo recheado de atores de Malhação venha lhe despertar.

Perguntas que Ficam

Além das perguntas e questionamentos sobre Belo Monte que, provavelmente, só serão respondidos depois que a hidrelétrica estiver em operação, há outros que podemos deixar no ar para reflexão sobre meio ambiente, vida saudável, desenvolvimento sustentável e energia:

1 - Não é contraditório alguém defender desenvolvimento sustentável (e, portanto, saudável) com um cigarro nas mãos?

2 - Não é ainda mais contraditório alguém defender uso racional dos recursos naturais proclamando-se usuário de IPad, IPhone, ITudo? Não seria interessante que os bem intencionados apresentadores do vídeo também propusessem medidas cotidianas de economia de energia e contenção do consumismo?

*Adjútor Alvim é o "Editor" do blog Casa de Tolerância